Podemos definir o movimento espírita como o conjunto de atividades objetivando apresentar o Espiritismo ao alcance e a serviço de todos os homens por intermédio do seu estudo, da sua prática e da sua difusão. A base desse processo é o centro espírita. Este deve promover atendimento fraternal a todos os que o procuram para obter orientação, esclarecimento, ajuda ou consolação, com base no Evangelho de Jesus à luz da codificação kardeciana.
O centro espírita proporciona aos seus frequentadores a grande oportunidade de exercitar o aprimoramento íntimo pela vivência do Evangelho em suas atividades. A simplicidade na prática da caridade, a total ausência de imagens, paramentos, símbolos, rituais, sacramentos ou outras quaisquer manifestações exteriores têm que ser as suas principais características. É o marco fundamental do movimento espírita.
No Brasil, como está o movimento espírita? Sobre isso, procuramos registrar aqui, com a maior fidelidade possível, alguns argumentos de Francisco Cândido Xavier, conforme publicado no livro Estudos no Tempo.1
As advertências do Chico são atuais e ecoam em nossa acústica doutrinária, convidando-nos a uma reflexão urgente e séria, em torno do movimento espírita, cuja missiologia é a de reviver o Cristianismo primitivo em sua simplicidade, e que tem na máxima "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei" 2 a sua expressão maior.
Não precisamos fazer um esforço descomunal para identificar, nas hostes espíritas, um ranço elitista abominável. Sobre isso, Chico avisa: "É preciso fugir da tendência à "elitização" no seio do movimento espírita. É necessário que os dirigentes espíritas, principalmente os ligados aos órgãos unificadores, compreendam e sintam que o Espiritismo veio para o povo e com ele dialogar. É indispensável que estudemos a Doutrina Espírita junto às massas, que amemos a todos os companheiros, mas, sobretudo, aos espíritas mais humildes, social e intelectualmente falando, e deles nos aproximarmos com real espírito de compreensão e fraternidade". 3
A falta de simplicidade que se observa, principalmente nos "centrões", é algo trágico e se não abrirmos os olhos, segundo Chico, "daqui a pouco estaremos em nossas casas espíritas apenas falando e explicando o Evangelho de Cristo às pessoas laureadas por títulos acadêmicos ou intelectuais e confrades de posição social mais elevada. Mais que justo é que evitemos isso – repetiu várias vezes – a "elitização" no Espiritismo, isto é, a formação do "espírito de cúpula", com evocação de infalibilidade, em nossas organizações". 4
Há um extravagante formalismo por parte daqueles que são responsáveis pelas casas espíritas. Segundo Chico, "prioriza-se a preocupação com o patrimônio material ao invés do espiritual e doutrinário; é a preocupação de inverter o processo de maior difusão do Espiritismo, fazendo-o partir de cima para baixo, da elite intelectualizada para as massas, exigindo-se dos companheiros em dificuldades materiais ou espirituais uma elevação ou um crescimento, sem apoio dos que foram chamados pela Doutrina Espírita, a fim de ampará-los na formação gradativa". 5
Nesse tópico, evocamos Allan Kardec, que deixou bem claro, na introdução ao O Livro dos Espíritos, que o caminho da Nova Revelação será de baixo para cima, das massas para as elites, porque "quando as ideias espíritas forem aceitas pelas massas, os sábios se renderão à evidência". 6
Segundo Chico Xavier, "é indispensável manter o Espiritismo, qual foi entregue pelos mensageiros divinos a Allan Kardec, sem compromissos políticos, sem profissionalismo religioso, sem personalismos deprimentes, sem pruridos de conquista a poderes terrestres transitórios". 7 Estaremos no rumo certo se conseguirmos conduzir a ideia espírita ao coração da comunidade, envolvendo o conhecimento superior no trabalho, tão intenso quanto possível, do amor ao próximo. "O serviço aos semelhantes fala sem palavras e, através dele, os sentimentos se comunicam entre si". 8
Em Brasília, existem centrões com até três mil médiuns e, paradoxalmente, nessas instituições, Kardec é um ilustre desconhecido. São centros que "vendem" ilusões de supostas curas desobsessivas com as mais estranhas terminologias. Estão infinitamente distantes do conselho do velho Chico Xavier, que ensinou: "O diálogo entre grupos reduzidos de estudiosos sinceros apresenta alto índice de rendimento para os companheiros que efetivamente se interessam pela divulgação dos princípios kardequianos". 9
Para os que laboram no projeto "unificacionista", promovendo congressos e seminários com taxas para ingressos, evocamos o médium mineiro, que admoesta com todas as letras: "Deveríamos refletir em unificação, em termos de família humana, evitando os excessos de consagração das elites culturais na Doutrina Espírita, embora necessitemos sustentá-las e cultivá-las com respeitosa atenção, mas nunca em detrimento dos nossos irmãos em humanidade que reclamem amparo, socorro, esclarecimento e rumo". 10 E acrescenta: "Não consigo entender o Espiritismo sem Jesus e sem Allan Kardec para todos, com todos e ao alcance de todos, a fim de que os nossos princípios alcancem os fins a que se propõem". 11
As federativas que promovem eventos excludentes, vão elitizando o movimento espírita e nos vão expondo a dogmatização dos conceitos espíritas na forma do Espiritismo para pobres, para ricos, para intelectuais, para incultos. Nessas ocasiões, há companheiros que não perdem a oportunidade de atrair para si os holofotes da "fama".
Os eventos gratuitos devem ter prioridade, obviamente. Urge que esses simpósios sejam estruturados visando uma programação aberta a todos e de interesse da Doutrina, não para ser uma ribalta de competição entre intelectuais com titulação acadêmica, como se fosse um "passaporte" para traduzirem "melhor" os conceitos kardequianos. Ah!... Que saudade do Chico Xavier!... Que saudade!
–––––––––––––––––– Notas e referências bibliográficas: 1 XAVIER, Francisco Cândido. Encontros no tempo. São Paulo: IDE, 2005. 2 João, 13: 34. 3 Entrevista concedida ao Dr. Jarbas Leone Varanda e publicada em jornal uberabense: "Um encontro fraterno e uma mensagem aos espíritas brasileiros". Da Obra "Encontros no tempo" - Entrevistas com o médium Francisco Cândido Xavier, assistido pelo espírito de Emmanuel.Organização e notas: Hércio Marcos Cintra Arantes. 4 Idem 5 Idem 6 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 2005. [Introdução]. 7 Entrevista concedida ao Dr. Jarbas
Leone Varanda e publicada em jornal uberabense: "Um encontro fraterno e
uma mensagem aos espíritas brasileiros". Da Obra "Encontros no tempo" -
Entrevistas com o médium Francisco Cândido Xavier, assistido pelo
espírito de Emmanuel.Organização e notas: Hércio Marcos Cintra Arantes. 8 Entrevista ao Jornal Unificação, de São Paulo/SP, e publicada em sua edição de julho/agosto de 1977, com o título: "Nosso jornal entrevista Chico Xavier". Da Obra "Encontros no tempo" -
Entrevistas com o médium Francisco Cândido Xavier, assistido pelo
espírito de Emmanuel.Organização e notas: Hércio Marcos Cintra Arantes. 9 Idem 10 Idem 11 Idem
Enviado por Geraldo Lemos Neto | Vinha de Luz Editora | Jaime Togores | Imagem: acervo da Casa de Chico Xavier
29/12/2015
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