Quatro vidas de um cachorro |
O tema reencarnação dos animais não causa qualquer ruga de estranhamento na testa de quem estuda o Espiritismo com pelo menos alguns dedos de profundidade. Tão lógica quanto filosoficamente necessária, a passagem deles por uma longuíssima série de experiências corpóreas não é a melhor mas sim a única explicação que traz sentido completo às suas existências, como às nossas, afastando num gesto firme e suave aquela costumeira revolta humana frente ao sofrimento, com os seus velhos e descabelados melodramas. O que também deve ser afastado, tanto neste quanto em todos os assuntos de ordem espiritual, são as fantasias simplórias ou oportunistas que se infiltram nos estudos de tamanha seriedade e transcendência. É o caso da metempsicose, que afirma erroneamente que um ser humano pode reencarnar como animal ou vegetal (doutrina professada por algumas religiões antigas e ainda hoje fortemente presente em diversos países, como a Índia). Porém, o espírito em si, que atingiu o desenvolvimento psíquico até a escala hominal, não pode jamais retroceder ao reino animal e muito menos vegetal. As obras espíritas expõem isso com muita clareza, a começar pelo basilar O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec(1). Infelizmente, ideias equivocadas assim ainda se espalham sem escrúpulos através de rotas culturais de grande alcance, como o Cinema. Vimos isso acontecer no lamentável Lembranças de Outra Vida (Fluke)(2), onde um homem morre num acidente e volta reencarnado na figura do cão da própria família. Mas ainda bem que isso não tem nada a ver com o belíssimo Quatro Vidas de Uma Cachorro (A Dog’s Purpose)(3), cujo lançamento mundial ocorreu semana passada. Baseado no livro homônimo de W. Bruce Cameron(4), o longa-metragem conta com notável naturalidade quatro etapas reencarnatórias de um cãozinho igual a tantos que conhecemos. Sem causar desconforto pelo fato de ser narrada pelo próprio animal – o que acolhemos como encantadora licença poética, liberada de conflitos doutrinários – a história se desenrola de maneira dinâmica, embora um tanto previsível, conseguindo divertir e emocionar nos momentos certos. Bem roteirizado, bem filmado e bem dirigido, não é nem um pouco apelativo; não cansa nem extrapola em termos sentimentais, ao mesmo tempo que assume tranquilamente aquilo que os críticos gostam de chamar de clichês. Todavia, isso pouco importa, já que não há como não se emocionar – a não ser que você seja como tantos corações de pedra que existem por aí, justificando sua dureza com críticas depreciativas, no intuito de destruir nos outros aquilo que falta em si mesmos. É uma satisfação notar que os roteiristas conseguiram responder de modo sintético e eficaz a alguns questionamentos que possam surgir na mente do expectador, sobretudo no final, sem recorrer a discursos explicativos de caráter religioso. Falta, é claro, a profundidade científica e argumentativa do Espiritismo – o que não se pode esperar neste tipo de filme. Por isso mesmo, precisamos dizer a você, realmente interessado em compreender as verdades espirituais, que vai precisar estudar muito... Não há outro caminho. Sobre o polêmico vídeo que circulou pela Internet sugerindo ou querendo sugerir que houve maus-tratos a um dos animais durante as filmagens, vi apenas o treinador ou membro da equipe de produção tentando fazer com que o cão entrasse na água para rodar a cena, inclusive passando a mão nele com carinho em certos instantes. O animal, por sua vez, demonstrava um receio natural, que é comum acontecer até mesmo quando são levados para tomar banho. Não sabemos, porém, se crueldades aconteceram em outros momentos. Em caso positivo, os responsáveis deverão ser punidos com rigor, sem dúvida, evitando futuras ocorrências semelhantes. Mas se você estava pensando em não assistir ao filme por causa disso, não deixe que um eventual erro (porque ainda não há provas suficientes) prejudique todo o conteúdo benéfico que esta obra artística pode propagar pelo planeta. O Plano Espiritual Superior exerce sua influência no mundo de forma constante e sem preocupações sectárias. Artistas, espiritualizados ou não, são médiuns que captam, nem sempre conscientemente, as correntes de pensamento positivas ou negativas que vertem do Outro Lado, traduzindo-as em seus trabalhos. Não temos dúvida de que este filme foi idealizado pelo Alto para trazer um pouco de iluminação às trevas de nossa ignorância, além de estimular o Amor entre todos os seres da Criação. Evidente que os espíritos encarnados e desencarnados ainda presos às sombras não desejam que isso aconteça; então, elaboram meios de atrapalhar o trabalho de realização e divulgação... Não vamos permitir isso, assim tão fácil. Vá ao cinema ou assista ao filme por outras mídias depois. O benefício é seu e de toda a Humanidade. Dê expansão ao seu raciocínio e às suas lágrimas. Saiba que o animalzinho que você cuidou no passado, que tantas alegrias lhe deu, que fez você sofrer tanto na hora da partida, vai lhe encontrar outra vez – aliás, pode estar aí agora mesmo, do seu lado! É a bondade de Deus a nos mostrar que, apesar de todos os temporários choques emocionais que a morte biológica traz, não há perdas verdadeiras nos amplos horizontes da Vida, mas apenas etapas e transformações no rumo do aperfeiçoamento.
Fernando Peron 31 de janeiro de 2017 http://www.saberemudar.com.br/index.php?q=fpqvuc ____________________________ (1) – O Livro dos Espíritos. Allan Kardec. Várias editoras. Segunda Parte, Capítulo 11: Os Três Reinos (Os Mineirais e as Plantas / Os Animais e o Homem / Metempsicose). (2) – Filme: Lembranças de Outra Vida (Fluke). EUA, 1995. Com Nancy Travis, Eric Stoltz, Samuel L. Jackson, etc. Direção de Carlo Carlei. Distribuição: MGM. (3) – Filme: Quatro Vidas de Um Cachorro (A Dog’s Purpose). EUA, 2017. Com Dennis Quaid, Peggy Lipton, K. J. Apa, etc. Direção: Lasse Hallström. DreamWorks Pictures. Distribuição: Universal Pictures. (4) – Livro: Quatro Vidas de Um Cachorro (A Dog’s Purpose). W. Bruce Cameron. Publicado no Brasil pela Editora HarperCollins. 12/02/2017 |
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