Na seara
Outubro | 1945
Entre ser espírita e dizer que é espírita há uma diferença realmente astronômica. Não é bastante a criatura encher os pulmões de oxigênio e depois deixar partir aos quatro ventos a afirmativa impensada: EU SOU ESPÍRITA!
Espírita, no sentido completo da expressão, não é coisa muito fácil, como possa parecer. Não é somente a pessoa frequentar sessões, tampouco ler obras de Allan Kardec, Bozzani, Flammarion, Léon Denis ou qualquer outro luminar do Espiritismo. Essa palavra traduz simplicidade e humildade, e requer muito sacrifício, muita abnegação e desprendimento. É necessário que a criatura demonstre, pelos seus atos na sociedade, no lar, e em todos os lugares onde se encontre, ser verdadeiramente tolerante e caridoso, saber considerar os seus semelhantes no mesmo pé de igualdade, sejam ricos ou pobres, pretos ou brancos, sadios ou doentes.
Não se concebe um espírita cheio de escrúpulos sociais ou desprezo pelas dores alheias, como não se concebe um espírita odioso e mau, guardando ressentimentos e desejos de vingança contra o próximo. Não se concebe, ainda, um espírita que, nos centros, nas sociedades, prega o Evangelho de Jesus e na vida particular, ou pública, não dá testemunho do que procura ensinar aos outros. Quem assim procede não está dentro dos preceitos divinos, não é espírita, está mentindo à própria consciência, está desvirtuando as finalidades da Doutrina regeneradora de Jesus.
Na prática da caridade, principalmente, se deve evidenciar a sinceridade daquele que seja espírita ou pretenda sê-lo, como se patenteia a contradição dos falsos espíritas. Jesus disse: “Não saiba a vossa mão esquerda o que dá a vossa mão direita”. Entretanto, quantas criaturas há que somente se comprazem em “fazer uma caridade”, quando há olhares curiosos, de pessoas conhecidas, observando o seu gesto filantrópico? Para estes, segundo ainda o meigo filósofo da Galileia, a recompensa já foi dada aqui na Terra. Os homens já viram e glorificaram os seus atos de vaidade e pretensão egoística, portanto, nada mais têm a receber quando transpuserem os umbrais luminosos da vida além-túmulo. Agora, para os que não alardeiam o que fazem, para estes sim voltar-se-ão as vistas misericordiosas e justas do Pai e o seu espírito receberá, por certo, a recompensa celestial pelo bem que praticou, sincera e ocultamente.
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Fonte: PERALVA SOBRINHO, José Martins; PERALVA, Basílio (Org.). Evangelho puro, puro Evangelho – Na direção do infinito. Belo Horizonte: Vinha de Luz Editora, 2009. p. 31-32. O Luzeiro, outubro de 1945. p. 1. Coluna “Na seara”.