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Notícia

A paz e a espada | Mensagem de Irmão Silvino, por Geraldo Lemos Neto


Fevereiro de 1863.

O frio inverno parisiense gelava os ânimos de quantos se aventuravam pela via pública no início da noite salpicada de estrelas no firmamento.

O Sr. Allan Kardec organizava algumas mensagens e considerações em torno de nova obra que pretendia editar, aquela mesma que um ano à frente viria a lume como a “Imitação do Evangelho segundo o Espiritismo” – primeira versão de “O Evangelho segundo o Espiritismo”, que hoje estudamos. 

O venerável professor Rivail remexia algumas correspondências cheias de ataques e sarcasmos em torno do Espiritismo. Ele estava profundamente entristecido, desalentado... 

Como enfrentar semelhante situação? – questionava, no íntimo.

Havia publicado as duas obras pilares da Doutrina Espírita com espírito de dedicação e sacrifício – “O Livro dos Espíritos”, de 1857, e “O Livro dos Médiuns , de 1861. Desde então uma chuva de impropérios e achaques atingiu-lhe a estrada. Tentava manter a serenidade e, no silêncio da prece, rogava ao divino Mestre forças para tudo suportar com paciência e compreensão. A Sociedade Espírita de Paris e a Revista Espírita já eram uma realidade atuante, absorvendo-lhe todos os esforços, inclusive pecuniários, para sustentar as tarefas iniciantes. 

Ali, na sede das sociedades, no primeiro andar do número 59 da Rue e Passage Sainte-Anne, Kardec se deteve na análise de duas correspondências.

A primeira, mais sarcástica, continha relatos de um sacerdote católico-romano, ridicularizando a mediunidade e a reencarnação. Argumentava o prelado com desprezo, narrando episódio ridículo, em que um suposto médium, ao receber uma mensagem espiritual para uma viúva aflita, revelava-lhe que seu marido reencarnara num jumentinho de fazenda vizinha. E, depois disso, a pobre senhora, após adquirir o referido muar, deu-lhe guarida dentro da própria casa. E após o ridículo desse absurdo caso, o sacerdote esmerava-se em impropérios.

Kardec sentia o peito opresso diante de tanta ignorância, uma vez que em Doutrina Espírita não se admite a possibilidade de retrocesso evolutivo preconizado pela metempsicose.

Na segunda missiva, outro absurdo. Dessa vez era a carta de um pretenso adepto do Espiritismo pedindo esclarecimentos a Kardec quanto a suposto episódio relatado por um amigo que teria presenciado uma reunião mediúnica na própria casa do professor Rivail. Segundo o missivista, as trinta pessoas presentes à dita reunião teriam levado uma surra de bengaladas aplicada pelos próprios espíritos comunicantes.

Kardec enxugou discretas lágrimas, meneando negativamente a cabeça, diante de novas calúnias, dessa vez surgidas no próprio meio espírita.

Guardando os mencionados papéis cuidadosamente, Allan Kardec resolveu encerrar o expediente e dirigir-se ao sítio de sua futura residência na Ville de Ségur. O venerável professor tomou a condução e antes que se aproximasse dessa obra, solicitou ao cocheiro o deixasse no Boulevard des Invalides. Desejava espairecer um pouco, desanuviando os sentimentos de desânimo que o assaltavam. 

Caminhou por alguns instantes no Boulevard deserto, tomando a direção de sua futura casa, enquanto, no pensamento, questionava, de si para consigo mesmo, se valeria a pena prosseguir com o projeto do “O Evangelho segundo o Espiritismo”. 

Alguns instantes se passaram até que Kardec passou a ouvir grande gritaria nas escadarias do átrio da Igreja de São Francisco Xavier, ainda em construção. 

Sem que pudesse fazer qualquer coisa, viu uma anciã indefesa sendo assaltada por dois jovens malfeitores.

Assistiu à distância a intervenção do sacerdote da igreja, que gritou em altos brados para que os três se afastassem.

Debalde a velhinha ferida procurou socorro no interior do templo religioso, cujas portas foram estrepitosamente cerradas na sua cara pelo irritado sacerdote.

Os dois malfeitores fugiram na confusão, deixando a senhora estirada no chão frio. 

Allan Kardec apressou o passo, a fim de socorrer a infeliz. 

Levantou-a. Ofereceu-lhe um braço amigo e convidou-a a seguir com ele. No caminho, a velhinha maltrapilha revelou a Kardec que os dois delinquentes eram seus próprios filhos, enveredados no crime na grande capital. Eram provenientes da Ville de Lisieaux e desde a morte do marido tiveram a propriedade rural confiscada por credores, restando-lhes apenas viver da misericórdia alheia. Os dois filhos estavam, então, a subtrair-lhe o resultado das esmolas do dia, com fins inconfessáveis.

Mais alguns quarteirões à frente, atingiram a Avenue de Ségur e, finalmente, a Ville de Ségur, ao número 39, onde o professor Rivail e sua bondosa Amélie Boudet haviam adquirido vasto terreno e começaram a construir um abrigo para idosos e desamparados da sorte. Para lá também tinham planos de transferir as sedes da Sociedade Espírita de Paris e da Revista Espírita, bem como o projeto de uma grande biblioteca do Espiritismo, além da obra em curso de sua futura residência.

A senhora Rivail recebeu a convidada com consideração e respeito. Pensaram-lhe as escoriações e feridas, vestiram-na adequadamente, e ofereceram-lhe digna refeição. A noite ia alta quando os Rivail resolveram pernoitar ali mesmo, e, antes que o sono os absorvesse, convidaram a inesperada visitante para as orações noturnas. Kardec, então, orou em voz alta, de alma e coração. Para sua surpresa, contudo, a visitante, de nome Jeanne, foi tomada de profundo torpor.

 Emperdigou-se. Tomou um ar de gravidade e, em pleno transe mediúnico, passou a falar em outro timbre de voz, dirigindo-se a Allan Kardec:

- “Meu irmão, hoje foste a personificação da figura do bom samaritano para com esta pobre sofredora. Cumpriste o teu dever de amor e de caridade, e por isso mesmo nós te conclamamos a esquecer e perdoar, perseverar e prosseguir no caminho que Deus te concedeu. Não desanimes com as ofensas e os ataques de quem quer que seja. A obra que estás a escrever será de vital importância para o futuro desta humanidade ignorante e incrédula. Persista no propósito de organizá-la para que a luz do Evangelho do Senhor Jesus Cristo retorne triunfante ao entendimento de seus tutelados na face da Terra. Estaremos sempre contigo nas tarefas de esclarecer e consolar.”

Kardec chorava profusamente. Aquelas palavras lhe consolaram sobremaneira as aflições dos últimos tempos, afastando todo sentimento de desânimo e tristeza que até então abrigara no próprio peito.

Enxugando as lágrimas, Kardec agradeceu as palavras do benfeitor, indagando-lhe o nome. A entidade comunicante então lhe falou:

– “Sou o patrono da Igreja onde socorreste esta pobre infeliz. Na Terra, fui conhecido ultimamente por Francisco Xavier, que, juntamente com Inácio de Loyola, fundou a ordem da Companhia de Jesus. 

Em nome dos Jesuítas parti da Europa em destino aos confins da Ásia pregando o Evangelho do Reino de Deus.""

As preces da noite foram encerradas sob forte comoção. 

No dia seguinte, logo cedo, de alma renovada, Kardec dirigiu-se novamente às suas atividades diárias na Revista Espírita, e, respondendo aos missivistas de véspera, escreveu: 1

“O Espiritismo tem a sorte de todas as verdades novas que levantam as paixões das pessoas cujas ideias e interesses elas podem ferir. Tanto é dever de todo bom espírita esclarecer aos que o procuram de boa fé quanto é inútil entrar em discussão com os antagonistas de má-fé ou ideias preconcebidas. Toda discussão é supérflua com aquele que não leu. Digo, pois, a todos os espíritas: continuai a semear e a divulgar a ideia. Espalhai-a pela doçura e pela persuasão das boas obras”.


Irmão Silvino



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 Nota do autor espiritual: vide anotação do Sr. Allan Kardec na edição do mês de maio de 1863 da Revista Espírita. Estudo da noite: E.S.E. – Capítulo XXIII – Itens 9 a 17. Página psicografada em noite de 25 de outubro de 2004 no Centro Espírita Luz, Amor e Caridade, na cidade de Belo Horizonte, MG, por Geraldo Lemos Neto.

Nota do médium: Hoje, dia 15 de abril de 2022, diante das mesmas escadarias no átrio da Église de Saint-François-Xavier, no aniversário de 158 anos de O Evangelho Segundo o Espiritismo, o médium, que esta subscreve, não pode deixar de observar o quanto este inesperado fenômeno, que vincula o espírito de São Francisco Xavier à caridade, impactou a personalidade do codificador Allan Kardec, fazendo-o, inclusive, assumir este mesmo nome, quando veio completar sua missão, no século XX, na pele de Francisco Cândido Xavier.

















Enviado por Geraldo Lemos Neto | Vinha de Luz Editora | Fotografias © Geraldo Lemos Neto
15/04/2022
 


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