Entrevista para Ismael Gobbo ao Notícias do Movimento Espírita
Jhon Harley Madureira Marques
O entrevistado Jhon Harley Madureira Marques nasceu e reside em Pedro Leopoldo, MG, na cidade onde também nasceu Francisco Cândido Xavier, o nosso querido Chico Xavier. Jhon é casado e pai de três filhos. Teve convivência muito próxima com Chico Xavier a partir de 1981 e, desde então, começou a pesquisar sobre a vida e a obra do famoso médium culminando na edição do importante livro “O Voo da Garça”, lançado em 2010, em comemoração do centenário de Chico Xavier, onde descreve a trajetória de Chico Xavier em Pedro Leopoldo, desde o dia 2 abril de 1910, data de seu nascimento, até sua mudança para Uberaba, no dia 4 de janeiro de 1959.
Jhon poderia nos fazer sua apresentação?
Meu nome é Jhon Harley Madureira Marques. Sou filho de Arlete Madureira Marques e José Sérgio Marques (já desencarnado).Tenho 48 anos. Sou natural de Pedro Leopoldo, Estado de Minas Gerais. Sou casado há 23 anos com Renata. Temos três filhos: Gabriel, Guilherme e Gustavo.
Qual sua formação acadêmica e profissional?
Sou formado em técnico em Mecânica pelo CEFET/MG desde 1979. Completei o curso de graduação em Educação Física pela UFMG em 1983. Posteriormente, terminei o curso de graduação em Psicologia pela FUMEC em 1988. Fiz especialização em Educação Física Escolar na PUC/MG em 1994 e, finalmente, completei o Mestrado em Tecnologia no CEFET/MG em 1998. Desde setembro de 1991 sou professor de Educação Física do CEFET/MG.
Desde quando é espírita e como conheceu o Espiritismo?
Minha formação religiosa, como muitos da minha geração, foi estruturada nos princípios do cristianismo, sob a interpretação do movimento católico. Na adolescência, por alguns anos, cheguei também a participar do movimento umbandista. A convite do meu tio Hélcio Marques, hoje trabalhador da Casa de Chico Xavier em Pedro Leopoldo, comecei a participar de uma reunião no Grupo Espírita Scheilla, exatamente no dia 20 de novembro de 1980. Foi amor à primeira vista.
A que casa está vinculado presentemente e quais as atividades que nela desenvolve?
Desde 1980 participo das atividades do Grupo Espírita Scheilla, instituição fundada por José Flaviano Machado (Zeca Machado), no dia 03 de agosto de 1954, sob a orientação de Chico Xavier. Participei das atividades da Mocidade Espírita por 10 anos e até hoje participo de reunião mediúnica e do estudo do evangelho. Em 1988, com um grupo de amigos e com o apoio da União Espírita Mineira, organizamos a Aliança Municipal Espírita de Pedro Leopoldo. Atualmente, além destas instituições, participamos das atividades da Casa de Chico Xavier e da Fundação Cultural Chico Xavier, ambas de Pedro Leopoldo.
Como conheceu Chico Xavier?
Por volta dos 17 anos de idade, em diversas ocasiões, tive sonhos curiosos onde Chico Xavier era o protagonista. Ouvindo falar muito em Chico Xavier, comecei alimentar um insistente desejo de conhecê-lo. Passei a sonhar que ele, sorridente, me olhava atentamente. Corria para encontrá-lo, mas quando chegava próximo ele já se encontrava em outro lugar. Estes sonhos persistiram por um bom tempo e deixaram significativas impressões.
Na inauguração da Praça Chico Xavier, por iniciativa da Prefeitura Municipal de Pedro Leopoldo, no dia 15 de novembro de 1980, a primeira homenagem pública do povo pedroleopoldense ao seu ilustre filho, tentei conhecê-lo na casa de sua irmã Maria Luiza Xavier, mas todos os esforços foram infrutíferos. Muita gente. Muita confusão. Naquele momento, percebi que outras pessoas também alimentavam este mesmo desejo.
Depois de outras tentativas, tive a alegria de conhecer Francisco Cândido Xavier em 1981, na casa de sua irmã Cidália Xavier de Carvalho. Confesso que fiquei, sob certa hipnose, olhando fixamente para o tão falado Chico Xavier. Encontro, reencontro, não sei... Mas a partir daí mantivemos um relacionamento de respeito e amizade que só foi interrompido mediante sua desencarnação, no dia 30 de junho de 2002.
Jhon você que reside em Pedro Leopoldo teve e tem contato com pessoas que conviveram com o Chico. Nossa pergunta é no sentido de saber como era o Chico Xavier na vida pessoal, fora do meio espírita.
Em 21 anos de convivência, pude confirmar o que muitas pessoas já diziam ser ele um ser humano profundamente generoso, de hábitos simples, vivendo de sua modesta aposentadoria. Um típico mineiro que adorava uma boa prosa e ficava profundamente constrangido com elogios. Parafraseando o biógrafo uberabense Carlos Baccelli diria ser Chico não um “anjo” exercendo o papel de um homem, mas um homem, do mundo e no mundo, exercendo o papel de um “anjo”.
Você pesquisou sobre o real motivo da ida de Chico para Uberaba? Tem a ver com o sobrinho perturbado ou com o Padre Sinfrônio?
No início da década de 80, quando o Chico vinha frequentemente visitar os seus familiares em Pedro Leopoldo, em um encontro que tivemos em sua residência, nos fundos da casa de sua irmã Maria Luiza Xavier, ele disse claramente que, em princípio, não deveríamos sair da cidade onde nascemos. E completou dizendo que no seu caso não foi possível permanecer em sua cidade natal por razões que, na época, não chegou a descrever claramente.
Confesso que a partir desta recomendação procurei organizar minha vida pessoal e profissional em Pedro Leopoldo ou próximo a minha cidade, como por exemplo, Belo Horizonte. Do ponto de vista profissional cheguei até a recusar alguns convites fora do estado, pois entendia que um aconselhamento partindo de Chico Xavier tinha o peso de uma determinação.
Digo isto para que possamos entender a complexidade de uma decisão tomada por Chico Xavier ao sair de sua terra natal. Até hoje muitos espiritistas vêm procurando encontrar uma única razão que justifique a saída de Chico Xavier de Pedro Leopoldo para a cidade de Uberaba. Entretanto, creio que não existiu uma única razão, mas diferentes razões que somadas culminaram na saída de Chico Xavier no dia 04 de janeiro de 1959.
Em uma carta endereçada a Dona Hermelita, grande amiga de Chico Xavier da cidade de Matozinhos (7 Km de Pedro Leopoldo), ele dizia que já era desejo sair da cidade de Pedro Leopoldo por volta de 1965, quando o então estudante, Waldo Vieira completasse a sua formação acadêmica. Entretanto, em função das graves e falsas acusações do sobrinho Amaury Pena, filho da irmã Maria da Conceição Xavier Pena, residente em Sabará (40 Km de Pedro Leopoldo), diríamos que Chico Xavier teve que antecipar a sua saída.
Quais os livros de sua autoria?
Somente dois livros. Primeiro a minha dissertação de mestrado lançada em 1998 intitulada: “A Educação Física na Escola Técnica Federal de Minas Gerais e a política nacional para a área: diferenças nos discursos?”. E o segundo livro lançado em 2010: “O Voo da Garça: Chico Xavier em Pedro Leopoldo (1910-1959).
A rigor, não podemos esquecer de que todos nós estamos escrevendo o livro mais importante de nossas vidas, não é mesmo? Cada dia estamos escrevendo uma página dizendo o que pensamos, o que falamos e como agimos.
Poderia nos falar sobre o livro de sua autoria O Voo da Garça recentemente lançado?
As razões deste livro começaram a tomar forma em abril de 1995, quando o Jornal “Oficina Humana”, de circulação restrita na região de Pedro Leopoldo, lançou uma edição comemorativa dos 85 anos de Chico Xavier. A convite da diretora do Jornal, Núbia Albano Soares, escrevi um artigo onde procurei falar um pouco mais sobre a sua humanidade. Dizia no artigo: “Quando se fala em Chico Xavier muitas pessoas imaginam um ser distante de nossa realidade. Um mito inabordável a qualquer sentimento humano, como se ele não fosse de carne e osso”. Em outra passagem considerava: “Desmistificar o mito Chico Xavier é reconhecer que como qualquer ser humano ele tem limites e necessidades de carinho, respeito e atenção”.
Como mantínhamos uma regular correspondência, enviei para Uberaba alguns exemplares e qual não foi a minha surpresa quando recebi uma carta e um telegrama do próprio Chico pedindo que, se fosse possível, enviasse outros exemplares. O artigo nada tinha de excepcional, sua linguagem era muito simples, uma conversa ao “pé do ouvido”, falando de um Chico Xavier tão humano como qualquer um de nós, mas que vivendo intensamente a sua humanidade, nos dava a impressão de um ser humano diferente e especial.
Quando me perguntam sobre o diferencial do livro levanto quatro questões: Em primeiro lugar sou o primeiro pedroleopoldense a escrever um livro (transita entre um documento histórico e uma obra biográfica)sobre o pedroleopoldense Chico Xavier. Não significa dizer que seja o verdadeiro olhar, mas um olhar dentre muitos outros olhares.
Em segundo lugar, o livro procura reconstruir os anos que Chico Xavier viveu em Pedro Leopoldo. Quero destacar aqui que não tenho nada contra a belíssima cidade de Uberaba, mesmo porque convivi com o Chico Xavier mais em Uberaba do que em Pedro Leopoldo. São duas cidades co-irmãs que tiveram o privilégio de receber o grande missionário do amor e da caridade.
Em terceiro Lugar, procurei recuperar algumas informações históricas que foram ignoradas e esquecidas ou equivocadamente reproduzidas entre alguns de seus biógrafos.
E, finalmente, o aspecto que considero mais importante da obra, procurei falar da humanidade de Chico Xavier. Creio que o maior legado deixado por Chico Xavier foi a sua exemplificação. Chico Xavier demonstrou ser humanamente e concretamente possível a construção de uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais feliz. Como ele sempre dizia: "a melhoria do mundo começa em cada um de nós". Você gostaria de dizer mais alguma coisa?
Dentre as muitas virtudes de Chico Xavier gostaria de destacar uma: o respeito pelas diferenças. Sinceramente, Chico reconhecia e respeitava o tempo de cada um. Para mim foi a pessoa que melhor conseguiu perceber e escutar o outro. Creio que todos nós que militamos no movimento espírita precisamos urgentemente exercitar esta qualidade. Infelizmente ainda falamos mais do que agimos. Parafraseando Chico Xavier diria: "a melhoria do nosso movimento espírita começa em cada um de nós".
Enviado por Ismael Gobbo | SP
18/10/2010
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