HÁ UM SÉCULO
"Paris - Numa fria manhã de abril de 1860, Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, estava exausto. Apesar da consolidação da Sociedade Espírita de Paris e da promissora venda de livros, escasseava o dinheiro para a obra gigantesca que os espíritos superiores lhe haviam confiado. A pressão aumentava, cartas sarcásticas chegavam.
Quando se mostrava mais desalentado, a esposa, Madame Rivail, entrega-lhe uma encomenda. O professor abre o embrulho e encontra uma carta de um encadernador de livros. E lê: “Sr. Allan Kardec, com a minha gratidão remeto-lhe o livro anexo, bem como a sua historia, rogando-lhe, antes de tudo, prosseguir em suas tarefas de esclarecimento da humanidade, pois tenho fortes razões para isso”. O autor da carta relatava que, desesperado após a morte de sua esposa, planejou suicidar-se. Certa madrugada, buscou uma ponte. Ao fixar a mão direita para atirar-se às águas, tocou um objeto que se deslocou da amurada, caindo-lhe aos pés. Surpreendido, viu um livro. Procurando a luz de um poste, leu: “Esta obra salvou-me a vida. Leia-a com atenção e tenha bom proveito. – A. Laurent”.
O Codificador desempacotou, então, um exemplar de “O Livro dos Espíritos”, ricamente encadernado. Na página do frontispício, leu com emoção não somente a observação a que o missivista se referira, mas também outra: “Salvou-me também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação. Joseph Perrier.” Após a leitura, o Professor Rivail experimentou nova luz a banhá-lo por dentro. Aconchegando o livro ao peito, raciocinava, em radiosa esperança: “Era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas.” O mundo necessitava de renovação e consolo.
Allan Kardec levantou-se, abriu a janela à sua frente, respirou profundamente, e, antes de retomar a caneta para o serviço costumeiro, levou o lenço aos olhos e limpou uma lágrima. (...)"