Hermínio Corrêa de Miranda, um dos mais respeitados escritores espíritas do Brasil, completou, em 5 de janeiro, 91 anos de idade. Do alto de seus belos e bem vividos anos, ele pode contemplar com a consciência do dever cumprido a bela missão de escritor que assumiu e cumpre com desvelado amor na seara de Jesus que ele tanto enaltece e agrada.
Apesar de ser seu o aniversário, quem recebeu o presente foi a FE e seus leitores. Conforme podemos auferir das significativas notas que nos oferece neste precioso encontro, já lança a inteligência e o olhar para novos horizontes, servindo a Deus e ao próximo sempre, incansavelmente.
A Hermínio os nossos parabéns, não só pelo aniversário, mas por toda a sua obra, desejando-lhe saúde e paz na companhia do divino mestre Jesus. Folha Espírita – Hermínio, o que pode nos dizer sobre o The sorry tale, livro que você traduziu com o título de A história triste?
Hermínio Corrêa de Miranda – O problema aqui é falar pouco, pois há muito que dizer desse livro singular. Por longos anos me senti atraído por ele, mas foi difícil tê-lo em mãos. De repente, as coisas começaram a acontecer. Nossa dedicada confreira Yeda Hungria, de Niterói, trouxe-me um exemplar dos Estados Unidos. Para não tomar espaço demais na consagrada Folha Espírita, remeto à leitora e ao leitor a introdução que escrevi para ele. O livro chama-se A história triste (The sorry tale) e foi ditado à médium Pearl Curran por uma entidade enigmática que se identificou como Patience Worth. Trabalhei na tradução cerca de dois anos. Foi muito difícil e, assim como hesitei em assumir a tarefa, várias vezes me senti inclinado a desistir. A história, contudo – sobre o Cristianismo primitivo –, sempre foi um dos meus temas prediletos, como vocês sabem. Finalmente, a tradução ficou pronta e foi lançada pela Lachâtre, em junho de 2009. Consta de quatro volumes, sendo três deles a narrativa em si, e um no qual o fenômeno Patience Worth foi examinado num texto meu, que a editora me concedeu a honra de colocar ao lado de Ernesto Bozzano, um dos ícones da minha galeria pessoal. FE – O livro sobre os cátaros merece também nosso destaque, porque eles foram dizimados pela Igreja Católica por pregarem os mesmos princípios do Espiritismo. Em 2009, quando a AME-Internacional esteve em Toulouse – região deles –, realizando o 2º Congresso Francofônico de Medicina e Espiritualidade, fomos a Carcassone – cidade medieval que os abrigou. Durante todo o evento, sentimos a boa influência espiritual que eles deixaram ao longo dos séculos naquela região. Fale-nos um pouco sobre o livro, do seu envolvimento.
Miranda – Esse é outro daqueles assuntos que me ocuparam a mente durante muitos anos. Eu me sentia impulsionado a escrever algo sobre o malogrado ideal cátaro, o precursor historicamente mais próximo da obra definitiva de Kardec. Depois de muita pesquisa, meditação e prece, senti-me encorajado a enfrentar a tarefa, o que fiz com emoção e a necessária disposição para dizer o que precisava ser dito. Não sei se teria eu algum envolvimento no trágico episódio que tanto marcou a história. É possível que sim. Espero saber um dia. FE – Você é um exemplo de senectude voltada para a ação construtiva, porque está voltado para a vivência da espiritualidade. Como você acha que os centros espíritas poderiam chamar a atenção dos mais idosos para o aproveitamento dessa fase da existência de maneira útil e proveitosa?
Miranda – Não tenho experiência suficiente com o movimento espírita. Como tenho dito, eu sempre desejei escrever. Foi uma opção que me vi forçado a fazer, a fim de não dispersar a atenção em muitas tarefas ao mesmo tempo, além das pesadas atribuições que tinha na vida profissional. A ideia é magnífica e precisa ser posta em prática. Imagino só quantos idosos – mulheres e homens – estão por aí na expectativa de informações que raramente ou nunca lhes chegam ao conhecimento. Ou questionamentos para os quais não tenham respostas e nem a quem recorrer. É preciso abrir espaço para que eles possam falar de si e ouvir o que o Espiritismo tem a lhes dizer sobre a vida. Tenho uma sugestão a oferecer: a de começar tudo com uma conversa preliminar com jovens espíritas. Certamente estarão prontos para levar aos grupos que frequentam os idosos de sua família ou amigos e vizinhos. Devem fazer isso sem a menor intenção proselitista de arrebanhar gente, a fim de converter tantos quanto possível ao Espiritismo. É preciso ouvi-los falar de seus problemas, dúvidas e sonhos. E mais: para ensinarem aquilo que aprenderam em suas experimentações com a verdade, como diria Mahatma Gandhi. Estou certo de que tanto jovens quanto velhos terão muito sobre o que dialogar e muito que ensinar e aprender uns com os outros. Afinal de contas, os problemas e enigmas que a vida nos propõe a cada passo estão aí mesmo diante de todos nós. Nem sempre temos condição de entendê-los sem a ajuda de uma doutrina lúcida e inteligente como a espírita. Mesmo porque, como advertiu Kardec, o Espiritismo não é um conjunto de especulações teóricas e sim uma leitura objetiva das leis divinas que regem nossas vidas. Tanto faz crer como não, é assim que se passam as coisas. A troca de ideias é produtiva e constitui um dos poderosos motores do processo evolutivo de todos nós, desde que saibamos separar ideias-trigo de ideias-joio. PS: Muito obrigado por sua generosa referência à minha assumida senectude. Se ainda estou por aqui, é porque o pessoal daí de cima entende que eu deva ficar. E ficando quero trabalhar, pois o Cristo nos alertou para o fato de que a seara é grande, mas os obreiros são poucos. FE – Você tem alguns outros projetos já delineados para levar avante?
Miranda – Tenho sim. Mais do que poderia pôr em prática numa só existência terrena. A gente tem mesmo de sonhar para que os sonhos um dia se realizem. Foi o que aprendi com uma canção que ouvi na Broadway, na década de 50, quando passei alguns anos em Nova York a serviço profissional. Posso lhe confidenciar, contudo, um desses sonhos. Há muitos anos desejo participar de um grupo que se proponha a passar a limpo a história do Cristianismo. Estou convencido de que temos de voltar às origens, ao tempo em que Jesus estava lá. Isso poderá ser feito consultando as memórias indeléveis guardadas na mente espiritual de gente que também lá estava. Essas testemunhas vivas não desapareceram para sempre tragadas pelos buracos negros da fantasia. Estão por aí mesmo, deste lado da vida ou do outro. Temos, além dessa fonte, o enigmático e ainda pouco estudado fenômeno da psicometria. Leitores interessados nesse assunto específico devem consultar um livrinho meu intitulado Memória cósmica. Como muito bem sabia e dizia Jesus, quando as criaturas se calam, as pedras falam. Elas falam de verdade e têm muita coisa para nos contar. Para mim, Cristianismo, quanto mais antigo melhor. Queremos beber outra vez daquela fonte na qual a eternidade falou pela voz dele, o Mestre supremo. Não é esse um belo sonho? FE – Qual mensagem deixaria para os nossos leitores neste 2011 que se inicia?
Miranda – A mensagem da esperança, uma esperança serena e convicta. A despeito da turbulência que impera em nosso planeta nestes tempos difíceis, o Universo não está abandonado à sua própria sorte. Nós é que passamos a nutrir a insensata ideia de que é possível abandonar Deus. Muitos nem sabem que Ele vive em nós, e nós Nele, “... como peixes no oceano”, segundo André Luiz, em sua poética e sábia linguagem. Portanto, nada há a temer, senão nossos insensatos desvios. Deus sempre soube o que fazer de nós por meio de Suas leis sábias e justas.
"Há muitos anos desejo participar de um grupo que se proponha a passar a limpo a história do Cristianismo."
A coleção A história triste é composta pelo romance (3 volumes) e pelo livro O mistério de Patience Worth, no qual Hermínio Miranda e Ernesto Bozzano relatam o resultado de suas pesquisas a respeito do espírito que ditou o romance A história triste.
É um romance mediúnico com uma riqueza de detalhes que transportam o leitor por cenas geográficas e historicamente irrepreensíveis. É a emocionante história de Hatte, filho ilegítimo do imperador Tibério com Teia, escrava grega transferida para a Palestina, onde, numa tenda de leprosos, fora dos muros de Belém, dá à luz na mesma noite em que Jesus vem ao mundo. Amargurada, Teia batiza seu filho com o sugestivo nome de Hatte (ódio), sentimento que vai dominar toda a sua existência. Os caminhos dessas duas crianças vão se cruzar até o fim. Considerada a melhor, mais surpreendente e bem articulada narrativa ambientada nos tempos de Cristo, A história triste recebeu elogios no exterior de críticos especializados em literatura. A edição em português do romance foi publicada em três volumes: I - Panda, II - Hatte e III - Jesus.
Obras do autor em ordem alfabética A dama da noite (coleção "Histórias que os espíritos contaram"); A irmã do Vizir (coleção "Histórias que os espíritos contaram"); A memória e o tempo; A noviça e o faraó; A reencarnação na Bíblia; A reinvenção da morte (incorporada ao livro As duas faces da vida); Alquimia da mente; Arquivos psíquicos do Egito; As duas faces da vida; As marcas do Cristo, publicada em dois volumes; As mil faces da realidade espiritual; As sete vidas de Fénelon (série "Mecanismos se.cretos da história"). Autismo, uma leitura espiritual; Candeias na noite escura; Com quem tu andas? (com Jorge Andrea dos Santos e Suely Caldas Schubert); Condomínio espiritual; Cristianismo: a mensagem esquecida; Crônicas de um e de outro (com Luciano dos Anjos); De Kennedy ao homem artificial (com Luciano dos Anjos); Diálogo com as sombras; Diversidade dos carismas; Eu sou Camille Desmoulins (com Luciano dos Anjos), publicada também em francês com o título Je suis Camille Desmoulins; Guerrilheiros da intolerância; Hahnemann, o apóstolo da medicina espiritual; Histórias que os espíritos contaram; Lembranças do futuro (incorporada ao livro As duas faces da vida); Memória cósmica; Nas fronteiras do além; Nossos filhos são espíritos; O Espiritismo e os problemas humanos (com Deolindo Amorim); O evangelho gnóstico de Tomé; O exilado (coleção "Histórias que os espíritos contaram"); O mistério de Patience Worth (com Ernesto Bozzano); O pequeno laboratório de Deus (anteriormente intitulada Negritude e Genealidade); O que é fenômeno mediúnico (série "Começar"); Os cátaros e a heresia católica; Reencarnação e imortalidade; Sobrevivência e comunicabilidade dos espíritos; Swedenborg, uma análise crítica. Traduções com comentários A feira dos casamentos (de J. W. Rochester, psicografada por Vera Ivanova Kryzhanovskaia); A história triste, publicada em três volumes (de Patience Worth, psicografado por Pearl Lenore Curran); O mistério de Edwin Drood (de Charles Dickens, com fin.l psicografado por Thomas P. James; Processo dos espíritas (de Madame Pierre-Gaetan Leymarie).
“Tenho projetos para mais de uma existência.”
Enviado por Geraldo Lemos Neto | Vinha de Luz Editora | Ismael Gobbo | SP | Folha Espírita | Fevereiro 2011 | In: www.folhaespirita.com.br
14/03/2011
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